Marcelo Dutra da Silva

Um tiro no pé do agronegócio brasileiro

Por Marcelo Dutra da Silva
Ecólogo
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O dia a dia anda tão corrido que mal dá tempo de acompanhar tudo que acontece. E acontece muita coisa. Há poucos dias, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal aprovou um projeto perigoso, que não deveria seguir em frente, pois visa flexibilizar a Lei e reduzir a proteção ambiental em áreas não florestais, como campos nativos da Mata Atlântica, Pampa, Pantanal, Cerrado e Caatinga. Na prática, um "freio de mão puxado" nas negociações e avanços que desejamos ver na jornada do agronegócio brasileiro, que a despeito do histórico, quanto aos modelos tradicionais de produção, vem se modernizando e se colocando como o setor da economia que mais incorpora práticas sustentáveis.

O agronegócio já é o nosso maior aliado na trajetória da descarbonização, na verdade o primeiro a nos abrir oportunidades para reduzir e neutralizar carbono na cadeia de produção, seja adotando novas tecnologias e formas de fazer, seja ampliando o esforço para manter mais áreas naturais preservadas. Portanto, com toda certeza, não será mudando a Lei ou flexibilizando parâmetro de proteção que vamos nos tornar a maior economia verde do Planeta.

De autoria da bancada ruralista, o projeto está sob regime terminativo e não precisa passar pelo plenário. Então, irá direto para o Senado. A medida prevê que qualquer área aberta, não florestal, pode ser livremente explorada, independente da presença de vegetação nativa, contando que tenha sido utilizada até julho de 2008. E o que mais impressiona é que também são consideradas no alvo da proposta as áreas de preservação permanente e reserva legal, fragilizando um instrumento fundamental de conservação, que se aplica à manutenção das paisagens e fluxos ecossistêmicos.

O autor do PL, deputado Alceu Moreira (MDB-RS), afirma que a medida visa regularizar imóveis rurais localizados nos campos de altitudes, da Mata Atlântica, que tem como objetivo livrar os proprietários de multas e embargos previstos na legislação ambiental e, para tanto, é preciso flexibilizar a legislação, mantendo a proteção dos campos de altitude, mas sem que isso atrapalhe o produtor rural de desenvolver suas atividades, os protegendo de eventuais multas, embargos, processos e aborrecimentos de toda ordem. Mas essa ideia original, que já era ruim, acabou ficando pior. Na Comissão, a proposta se estendeu para todo território nacional, ou seja, todo tipo de área aberta não florestal virou alvo e passou a ser considerada "área rural consolidada", como se o País inteiro, um dia, tivesse sido floresta.

Fato é que o espaço natural somado de todas as propriedades rurais brasileiras é maior que o total de áreas públicas conservadas, ou seja, a maior extensão de natureza está associada ao espaço de produção. Portanto, é do interesse do produtor manter sua propriedade produtiva e preservada, até além dos limites da preservação permanente e da reserva legal. Um patrimônio formado por florestas e áreas abertas não florestais, que são igualmente ricos em biodiversidade e que não podem ser suprimidos como se não importassem. Ademais, é perfeitamente possível conciliar a agricultura com conservação, não cabendo a defesa que isso servirá para beneficiar a nossa agricultura, rendendo mais recursos aos entes federados. Posso garantir que não vai!

Estamos em outro momento, de mais consciência, compromissos e visão estratégica de mercado. É do interesse absoluto dos produtores, produzir com sustentabilidade e atenção total aos objetivos do desenvolvimento sustentável, fazendo máximo uso das ferramentas da agenda ESG (Environmental, Social and Governance). Então, não será flexibilizando as leis, para ocupar mais parcelas do espaço com lavouras e pastagens, que vamos fazer a diferença, pois ela está no esforço que precisamos fazer para preservar ao máximo, usando melhor, com mais tecnologia e responsabilidade, as áreas que já ocupamos.​

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